Organizador de antologias de Vinícius e Caetano Veloso, poeta de uma escrita sofisticada, Eucanaã Ferraz vai debater sobre o tema Poesia em Rotação na sexta-feira, ao lado de João Batista de Morais Neto.
Ele estará por aqui no próximo dia 19 de novembro, durante o 3º Festival Literário de Pipa, discutindo suas ideias na mesa "Poesia em rotação", com mediação de João Batista de Morais Neto. Poeta e professor de literatura da UFRJ, pesquisador da poesia portuguesa contemporânea, o carioca Eucanaã Ferraz é editor da revista literária Serrote, e autor de diversos livros de poesia como "Martelo" (1997), "Desassombro" (2002), "Rua do mundo" (2004) além de organizador de antologias para Vinícius de Moraes e Caetano Veloso. Dono de uma rica produção literária não vê problema em se ter mais poesia e mais poetas para se ouvir e publicar. "Poesia é 100% inspiração e 100% transpiração", afirma.
Qual a necessidade do poeta e da poesia no mundo atual?
Nenhuma. Vivemos num mundo de desperdício ou de necessidades extremas. No primeiro caso, a poesia se confunde com milhões de outras coisas desnecessárias com ela, que existem apenas porque tudo pode existir num tempo-espaço em que o acúmulo é avassalador. No segundo caso, a poesia parecerá desnecessária se considerarmos que precisamos salvar a água do planeta para sobrevivermos. Mas o fato de a poesia ser um artigo de baixo consumo - e sempre o foi, não só neste que se pode chamar de "mundo atual" - não a torna um "artigo de luxo" e o poeta um ser extraordinário, criador de quintessências. O poema é um bem de produção, digamos, artesanal. Embora circule em meios industrializados, como livros, revistas e ambientes eletrônicos, é uma atividade de caráter individual. Se a própria idéia de luxo não combina com a natureza da poesia, ela nunca foi nem será um artigo de primeira necessidade. A aspiração maior da poesia seria impor-se nas sociedades do luxo e das necessidades básicas como um objeto essencial.
Como a linguagem pode explicar o mundo?
Não pode. E, no entanto, essa possibilidade, a da explicação, parece acanhada para a poesia, que quer mais do que explicar: quer refazer.
A palavra pode criar uma nova realidade?
A palavra cria realidades todo tempo. É exatamente isso que ela faz, mas quase sempre cria o já criado, ou seja, repete, repete, repete sem fim, automaticamente. Mas, ainda assim, é uma criação. A poesia alerta para isso: a palavra cria mundos. Um poema, que usa a palavra como nenhum outro discurso, cria realidades que vão muito além das realidades plausíveis, medíocres, opressoras, burocráticas, que engendramos diariamente.
Como se situar entre a forma e o conteúdo?
Entre a forma e o conteúdo. Exatamente ali: entre.
De que forma a poesia penetra nas experiências humanas?
Por meio da palavra, sua única matéria.
Como dizer o que não pode ser dito?
Reinventando a linguagem.
Poesia é mais inspiração ou transpiração?
Cheguei à seguinte fórmula: poesia é 100% inspiração e 100% transpiração. Penso que, na escrita do poema, uma coisa e a outra devem estar fundidas. Se pudermos separar uma coisa e outra é porque algo se perdeu. O ideal é que não possamos distinguir esses dois destinos.
O excesso de poetas prejudica ou engrandece a poesia?
O grande número de músicos, compositores e cantores no Brasil só fortaleceu a nossa música, fazendo-a forte, inteligente, sofisticada e realmente popular. Mantivemos a absoluta qualidade de nosso cancioneiro ao longo de todo o século XX pelo número de criadores e excepcionalidade de muitos deles, pelo grande público, pela manutenção da qualidade etc. Penso que a poesia só tem a ganhar com o crescimento do número de poetas, leitores, editoras, bibliotecas, livrarias, encontros literários etc.
O poema pode ser uma arma?
Sim, em vários sentidos. Em termos estritamente políticos, vejamos. Poesia e poetas sempre foram mal vistos pelo totalitarismo. A expulsão dos poetas por Platão em sua sonhada República é a imagem paradigmática dessa incômoda presença. Mas é certo que há, hoje, quem lamente o fato de o poeta ter sido, até certo ponto, absorvido pela indústria cultural, como se isso fosse um sinal da atual fraqueza da poesia. Afirmam: a poesia já não incomoda o poder e os poderosos. É um equívoco pensar desse modo. Poetas permanecem vigiados e mal vistos em regimes totalitários. Poetas, escritores, artistas e intelectuais que vivem na China, para citar apenas um exemplo, sabem-no muito bem. Outro erro absurdo seria lembrar com saudade dos tempos em que poetas eram tratados como subversivos pelas ditaduras.
Nenhuma. Vivemos num mundo de desperdício ou de necessidades extremas. No primeiro caso, a poesia se confunde com milhões de outras coisas desnecessárias com ela, que existem apenas porque tudo pode existir num tempo-espaço em que o acúmulo é avassalador. No segundo caso, a poesia parecerá desnecessária se considerarmos que precisamos salvar a água do planeta para sobrevivermos. Mas o fato de a poesia ser um artigo de baixo consumo - e sempre o foi, não só neste que se pode chamar de "mundo atual" - não a torna um "artigo de luxo" e o poeta um ser extraordinário, criador de quintessências. O poema é um bem de produção, digamos, artesanal. Embora circule em meios industrializados, como livros, revistas e ambientes eletrônicos, é uma atividade de caráter individual. Se a própria idéia de luxo não combina com a natureza da poesia, ela nunca foi nem será um artigo de primeira necessidade. A aspiração maior da poesia seria impor-se nas sociedades do luxo e das necessidades básicas como um objeto essencial.
Como a linguagem pode explicar o mundo?
Não pode. E, no entanto, essa possibilidade, a da explicação, parece acanhada para a poesia, que quer mais do que explicar: quer refazer.
A palavra pode criar uma nova realidade?
A palavra cria realidades todo tempo. É exatamente isso que ela faz, mas quase sempre cria o já criado, ou seja, repete, repete, repete sem fim, automaticamente. Mas, ainda assim, é uma criação. A poesia alerta para isso: a palavra cria mundos. Um poema, que usa a palavra como nenhum outro discurso, cria realidades que vão muito além das realidades plausíveis, medíocres, opressoras, burocráticas, que engendramos diariamente.
Como se situar entre a forma e o conteúdo?
Entre a forma e o conteúdo. Exatamente ali: entre.
De que forma a poesia penetra nas experiências humanas?
Por meio da palavra, sua única matéria.
Como dizer o que não pode ser dito?
Reinventando a linguagem.
Poesia é mais inspiração ou transpiração?
Cheguei à seguinte fórmula: poesia é 100% inspiração e 100% transpiração. Penso que, na escrita do poema, uma coisa e a outra devem estar fundidas. Se pudermos separar uma coisa e outra é porque algo se perdeu. O ideal é que não possamos distinguir esses dois destinos.
O excesso de poetas prejudica ou engrandece a poesia?
O grande número de músicos, compositores e cantores no Brasil só fortaleceu a nossa música, fazendo-a forte, inteligente, sofisticada e realmente popular. Mantivemos a absoluta qualidade de nosso cancioneiro ao longo de todo o século XX pelo número de criadores e excepcionalidade de muitos deles, pelo grande público, pela manutenção da qualidade etc. Penso que a poesia só tem a ganhar com o crescimento do número de poetas, leitores, editoras, bibliotecas, livrarias, encontros literários etc.
O poema pode ser uma arma?
Sim, em vários sentidos. Em termos estritamente políticos, vejamos. Poesia e poetas sempre foram mal vistos pelo totalitarismo. A expulsão dos poetas por Platão em sua sonhada República é a imagem paradigmática dessa incômoda presença. Mas é certo que há, hoje, quem lamente o fato de o poeta ter sido, até certo ponto, absorvido pela indústria cultural, como se isso fosse um sinal da atual fraqueza da poesia. Afirmam: a poesia já não incomoda o poder e os poderosos. É um equívoco pensar desse modo. Poetas permanecem vigiados e mal vistos em regimes totalitários. Poetas, escritores, artistas e intelectuais que vivem na China, para citar apenas um exemplo, sabem-no muito bem. Outro erro absurdo seria lembrar com saudade dos tempos em que poetas eram tratados como subversivos pelas ditaduras.
A República de Platão, nesse sentido, deve ser entendida como a imagem de um Estado que não repudiamos.
Fonte: Jornal Tribuna do Norte - http://tribunadonorte.com.br/noticia/poesia-objeto-essencial/202522
Fonte: Jornal Tribuna do Norte - http://tribunadonorte.com.br/noticia/poesia-objeto-essencial/202522
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